Grupos masculinistas propagam misoginia e ameaçam mulheres na internet


A Polícia Civil de São Paulo abriu inquérito, nesta terça-feira (1º), para investigar a ameaça de morte feita pelo autointitulado coach de relacionamentos Thiago Schutz contra a atriz e humorista Livia La Gatto.

Schutz faz parte do movimento RedPill, que inferioriza as mulheres falando que elas servem apenas para relações sexuais casuais, e que o atual sistema supostamente favoreceria as mulheres.

Livia La Gatto, por sua vez, fez dois vídeos nas suas redes sociais usando o humor para evidenciar os absurdos que são proferidos por esses grupos.

Nas redes sociais, Thiago Schutz alegou que suas ameaças – de que “se a atriz não retirasse conteúdo, ela levaria bala” – eram para ser consideradas de forma figurativa e não literal. Ele disse que não possui e nem tem porte de arma.

Esse caso não é único. A professora da Universidade Federal do Ceará (UFC) Lola Aronovich, uma das precursoras do ativismo feminista na internet, relatou que teria recebido ameaça de morte nesta semana e que o remetente expôs, inclusive, seus dados pessoais.

Convivendo há mais de 12 anos com essas ameaças, ela estuda o funcionamento desses grupos. Ela disse que o movimento RedPill é outra vertente desses grupos masculinistas e que, nesse caso, usam o suposto discurso de autoajuda nos relacionamentos para propagar machismo e misoginia.

“Uma das sinas deles é que eles são heterossexuais. Porque seria mais fácil, se eles fossem homossexuais, eles se relacionarem só com homens. Uma das coisas que eles dizem é que “se não tivesse vagina, eu nem falava com ela”. Ou seja, ele só vê a mulher como um objeto sexual. E tem gente que defende que não tem que ter nenhum relacionamento com mulher mesmo, ou só com prostitutas”, disse a professora.

Para a psicanalista Sabrina Arini, o surgimento desses grupos é uma reação de alguns homens contra a emancipação feminina e a luta por igualdade de direitos, que tirou dos homens o papel de destaque na sociedade. No entanto, Arini ressalta que é necessário trabalhar e dialogar com essa frustração masculina para que ela não se transforme em violência – seja contra eles mesmos, ou contra toda a sociedade.

“O que a gente escuta muito nos grupos é isso, e eu acho que ter uma resposta para isso, não se sentir esse cara, não consigo ser esse cara, que é ou eu vou deprimir ou eu vou ser mais violento. Eles saem para esses dois lados. Eles ficam com raiva e mostram a violência ou contra as mulheres ou contra eles mesmos. Brigam no trânsito, batem, se batem, gera violência. Ou uma coisa muito melancólica, muito depressiva, eu não sirvo, eu não presto, eu não me encaixo, eu não sou homem”, disse a psicanalista.

Sabrina Arini ainda vê outro perigo no fortalecimento dos grupos misóginos, que é a de negar a realidade a partir do discurso – uma tática amplamente usada pela extrema-direita em todo o mundo.

“Tem o RedPill, que é a pílula vermelha do filme Matrix, que é como se aquilo que você está vendo não é a realidade. A realidade é aquilo que eu vou te contar. Eu vou te contar e eu digo o que eu quiser. É uma estratégia da extrema direita do mundo, que é negociar a realidade. A gente olha no WhatsApp e lê que a economia está super bem, e eu vou no mercado e vejo que o leite está mais caro. É mais importante o que eu li do que eu estou vivendo no concreto. A partir do momento que a gente não compartilha mais uma realidade comum, socialmente, isso é gravíssimo. Eu saio do real e o conceito de sair do real é a loucura”, explica Arini.

Sabrina Arini é uma das coordenadoras da roda de conversa masculina Fala Homem, um espaço para que os homens possam falar sobre seus sentimentos e emoções, com encontros semanais todas as terças-feiras. Há também outros grupos na internet de discussão dessa chamada masculinidade tóxica como o projeto Memoh. Os dois projetos podem ser encontrados nas redes sociais @fala.homem e @projeto.memoh.



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