Conferência no Rio aborda movimentos LGBTI+ no Brasil e nos EUA
A Estação Carioca, do metrô do Rio de Janeiro, receberá, nesta sexta-feira (1º), às 19h, a conferência “Democracia, Movimento Social e o Cenário atual no Brasil e EUA”. Ela será apresentada por James Naylor Green. A conferência ocorre no contexto da exposição Amor & Luta. Green é doutor em história, professor da Universidade de Brown (EUA), fundador do Movimento LGBTI+ Brasileiro e autor e organizador de vários livros, entre eles: “Além do Carnaval”, “História do Movimento LGBT no Brasil” e “Revolucionário e Gay- A vida extraordinária de Herbert Daniel”. Também estão entre os debatedores Camila Marins, ativista lésbica negra, jornalista, editora da Revista Brejeira e mestranda em Políticas Públicas e Direitos Humanos pela UFRJ; Jaqueline Gomes de Jesus, ativista trans negra, professora doutora do IFRJ, pesquisadora, escritora e presidenta da Associação Brasileira de Estudos da Trans Homocultura (ABETH); e Cláudio Nascimento, ativista gay negro, presidente do Grupo Arco-Íris, diretor de Políticas Públicas da Aliança Nacional LGBTI+, pesquisador, documentarista e integrante do Conselho Nacional LGBTI+. Resistência De acordo com Camila, a conferência é fundamental para debater democracia, o papel do movimento social e também o atual cenário no Brasil e nos Estados Unidos. “A gente sabe que nos Estados Unidos existe uma agenda anti-LGBTQIAP+ que é importada pela extrema-direita para o Brasil. Precisamos construir uma resistência internacional a partir dos movimentos sociais para defender os direitos humanos e repensar as bases de uma outra democracia”. Segundo Jaqueline, o debate é muito importante porque abordará várias dimensões do debate democrático, não apenas em termos de políticas públicas, mas também de ações e de financiamento na produção de conhecimento pensando a população LGBT global. Amor & Luta A exposição, que conta com painéis ilustrativos, fotografias e peças de vestuário, apresenta a história do movimento LGBTI+ e do Grupo Arco-Íris, que em maio completou 30 anos de existência em defesa da diversidade e dos direitos humanos. O espaço expositivo foi divido em diferentes setores. Uma primeira parte apresenta a linha do tempo com os principais fatos relacionados ao movimento LGBTI+ e ao Grupo Arco-Íris. Depois, há um memorial voltado especialmente para a arte e cultura transformista. A ideia é homenagear atores e atrizes que contribuíram para divulgar as bandeiras de luta política por meio da cultura e da arte. Outros memoriais lembram cantoras lésbicas e bissexuais emblemáticas da militância, e ativistas que já faleceram e se destacaram na luta pelos direitos da comunidade no país. Source link
COP28: em vez de unir forças, o mundo trava guerras, diz Lula
Ao discursar para chefes de Estado e de governo na Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP28), em Dubai, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse nesta sexta-feira (1º) que o mundo pode estar diante do maior desafio já enfrentado pela humanidade e criticou conflitos como os registrados no Oriente Médio. “Em vez de unir forças, o mundo trava guerras, alimenta divisões e aprofunda a pobreza e as desigualdades”. Lula lembrou que o último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) é categórico sobre o perigo do aumento na temperatura global superar 1,5 grau Celsius (°C) e destacou que a meta fixada pelo Acordo de Paris é manter esse aumento entre 1,5°C e 2 °C. “Já é insuficiente para conter o aquecimento global em nível seguro.” “Temos um problema coletivo de inação e outro de falta de ambição. As NDCs [Contribuições Nacionalmente Determinadas, metas anunciadas por cada país para redução dos efeitos das mudanças climáticas] atuais não estão sendo implementadas no ritmo esperado. E mesmo que estivessem, não conseguiriam manter a temperatura abaixo do limite de 1,5°C. O Brasil ajustou sua NDC e se comprometeu a reduzir 48% das emissões até 2025.” Segundo Lula, a NDC brasileira é mais ambiciosa que a de vários países “que poluem a atmosfera desde a Revolução Industrial”, no século 19. “Mantemos o firme compromisso de zerar o desmatamento na Amazônia até 2030. Já conseguimos reduzi-lo em quase 50% nos dez primeiros meses deste ano, o que evitou a emissão de 250 milhões de toneladas de carbono na atmosfera”. “Mas muitos países do sul global não terão condições de implementar suas NDCs nem de assumir metas mais ambiciosas. Os mais vulneráveis não podem ter que escolher entre combater as mudanças do clima e combater a pobreza. Terão que fazer ambos. O princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas, é inegociável. Ameaçado, vai na contramão de qualquer noção básica de justiça climática.” O presidente classificou como inaceitável que a promessa de US$ 100 bilhões ao ano para conter os efeitos das mudanças climáticas, assumida por países desenvolvidos, não tenha saído do papel, enquanto, apenas em 2021, os gastos militares chegaram a US$ 2,2 trilhões. Lula destacou ainda que, no Brasil, a emergência climática já é uma realidade, citando a seca inédita registrada na Amazônia. “O nível dos rios é o mais baixo em mais de 120 anos. Nunca imaginei que veria isso no lugar onde estão os maiores reservatórios de água do mundo. O futuro da Amazônia não depende só dos amazônidas. O desmatamento em todo o mundo só responde por 10% das emissões globais. Mesmo que não derrubemos mais nenhuma árvore, a Amazônia poderá atingir seu ponto de não retorno se outros países não fizerem sua parte. Um aumento da temperatura global poderá desencadear um processo irreversível de savanização da Amazônia”. “Os setores de energia indústria e transporte emitem muito gás de efeito estufa. Temos que lidar com todas essas fontes. É por isso que o Brasil está propondo a missão 1.5. Uma missão coletiva, que vai nos manter na trilha de 1,5°C. Nos dois anos até a COP30, será necessário redobrar os esforços para implementar as NDCs que assumimos. E, em Belém, precisamos anunciar NDCs mais ousadas e garantir os meios de implementação necessários para concretizá-las”, disse. “Se não deixarmos nossas diferenças de lado, em nome de um bem maior, a vida no planeta estará em perigo e será tarde demais para chorar,” explicou. Fonte
Unesco: maioria de jovens com HIV aprova acolhida em serviços de saúde
Mais de 50% dos jovens que vivem com HIV no Brasil aprovam o acolhimento recebido em serviços de saúde. É o que revela uma pesquisa do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), entidade vinculada à Organização das Nações Unidas (ONU). Os dados do levantamento foram divulgados nesta sexta-feira (1º), dia em que é celebrado o Dia Mundial de Luta contra a Aids. A data foi instituída em 1988 pela Assembleia Geral da ONU. A pesquisa recebeu o título de “Nós somos a resposta: O que adolescentes e jovens que vivem com HIV/aids pensam sobre o acesso aos serviços de saúde no Brasil”. De acordo com os resultados, 64% dos respondentes de um questionário online avaliaram positivamente o acolhimento recebido. Por outro lado, 35,7% o classificaram como razoável ou ruim. Além disso, cerca de 20% dos entrevistados afirmaram que já vivenciaram, no sistema de saúde brasileiro, situações como desrespeito ao desconforto, privacidade, desconforto durante o atendimento ou sentimento de culpa ou vergonha por ser uma pessoa com HIV. Ao mesmo tempo, 13% relataram que tiveram seu diagnóstico positivo revelado sem consentimento pela equipe de saúde e 20% foram orientados a não ter relações sexuais. “É lei federal que resultados de exame de HIV devem ser comunicados de forma sigilosa”, observa Luciana Phebo, chefe de saúde do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) no Brasil. Também foram levantadas questões relacionadas ao deslocamento até o serviço de saúde: 21% afirmaram levar mais de uma hora, 53,7% entre 30 minutos e uma hora e 46,3% gastam até 30 minutos. Para Luciana Phebo, esses dados permitem entender melhor as barreiras para a adesão ao tratamento. “As dificuldades afastam os jovens”, assegura. O HIV é um vírus que afeta o sistema imunológico. A contaminação ocorre na maioria das vezes através do contato sexual desprotegido. O compartilhamento de objetivos perfurantes e cortantes como seringas, agulhas e alicates de unha também pode levar à transmissão. Dificuldades Quando uma pessoa é contaminada e não realiza tratamento, seu organismo começa a ter dificuldades para responder a infecções e doenças, configurando, assim, a aids. Nos últimos anos, o avanço do conhecimento científico e o aprimoramento do uso dos antirretrovirais vêm permitindo que mais pessoas que vivem com HIV não desenvolvam a aids. Com o tratamento adequado, a maioria dos pacientes consegue reduzir a carga viral no sangue para níveis indetectáveis. Quando isso acontece, a pessoa deixa de transmitir o HIV. Por esta razão, observa Luciana, o tratamento não apenas melhora a qualidade de vida de cada paciente como também é fundamental para interromper o ciclo de transmissão do vírus. A Unesco chama atenção que 44,1% das 40.880 notificações de HIV em 2021 envolveram pacientes entre 15 e 29 anos. “Apesar da contínua redução de novos casos na última década, o Brasil ainda apresenta altas taxas de novas infecções”, registra o relatório da pesquisa. Nessa quinta-feira (30), Ministério da Saúde divulgou dados referentes ao ano de 2022. O país registrou 43.403 novos casos de infecção por HIV no último ano. Ao todo, estima-se que um milhão de pessoas no Brasil vivem com vírus. Desse total, 90% (900 mil) já foram diagnosticadas, 81% (731 mil) das que têm diagnóstico estão em tratamento antirretroviral e 95% (695 mil) dos que estão em tratamento antirretroviral têm carga indetectável do vírus. Uma recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS) aos países é a busca da denominada meta 95-95-95 até 2030, para garantir que 95% das pessoas que vivem com o vírus sejam diagnosticadas. Dessas, ao menos 95% precisam ter acesso ao tratamento. E 95% dos pacientes que estão tratando devem conseguir reduzir o vírus a níveis indetectáveis. Entre os respondentes do questionário aplicado pela Unesco, 89,4% disseram que realizaram o teste de carga viral nos últimos 12 meses e estavam indetectáveis. Além disso, 91,7% afirmaram também que a equipe de saúde conversou sobre o teste de carga viral. Para a Unesco, as altas taxas de testagem e de indetectabilidade do vírus mostram a importância do sistema público de saúde e da realização do tratamento. Desafios A pesquisa foi realizada com o apoio do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids (Unaids) e da Rede Nacional de Adolescentes e Jovens Vivendo com HIV/Aids. Também contou com parceria técnica da empresa Oppen Social. O questionário online foi respondido por 710 pessoas entre 17 e 31 anos, sendo 488 residentes das capitais e 222 em outros municípios. Além do levantamento de dados quantitativos, foram realizadas rodas de conversas com 70 jovens de sete capitais e entrevistas com lideranças de coletivos que atuam em diferentes locais para uma análise qualitativa. Como apontam os resultados, o estigma ainda existente em relação à doença é considerado a maior barreira para uma acolhida adequada e humanizada. O sistema de saúde é valorizado de forma geral, embora tenham sido apontados desafios em relação ao preparo dos profissionais de saúde para trabalhar com pessoas vivendo com HIV. Falta de clareza Entre os pontos destacados nas rodas de conversas e entrevistas, estão a escassez de informações e a falta de clareza na comunicação sobre possibilidades de tratamento e sobre o processo de marcação de exames e consultas. Casos de fornecimento de informações conflitantes sobre o tratamento foram citados. Nessas situações, a atuação dos coletivos de jovens tem se revelado importante para a troca de experiências e acolhimento entre pares. Apesar das dificuldades mencionadas, também foram colhidos relatos de profissionais de saúde que atuaram de forma acolhedora e inclusiva. “Uma coisa que os jovens levantaram é a importância do acompanhamento psicológico durante o tratamento. São momentos impactantes. Outra questão é a expansão dos atendimentos. O acesso ao serviço de saúde é uma barreira para os jovens se manterem no tratamento. Ter uma agilidade na marcação das consultas vai certamente ampliar o acesso ao tratamento e às medicações”, opina Luciana Phebo. Segundo a Unesco, os dados levantados são úteis para guiar políticas públicas e outras ações capazes de transformar unidades de saúde em espaços acolhedores para adolescentes e jovens, e empoderar redes de
Lula: planeta está farto de acordos climáticos não cumpridos
Em seu primeiro discurso na abertura da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP28), em Dubai, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse nesta sexta-feira (1º) que o planeta está farto de acordos climáticos não cumpridos, de metas de redução de emissão de carbono negligenciadas, de discursos eloquentes e vazios e do auxílio financeiro aos países pobres que não chega. “O planeta já não espera para cobrar da próxima geração”. Durante a solenidade, lula citou que a humanidade sofre com secas, enchentes e ondas de calor cada vez mais extremas e frequentes e lembrou a seca no Norte do Brasil e as enchentes no Sul. “A Amazônia amarga uma das mais trágicas secas de sua história. No Sul, tempestades e ciclones deixam um rastro inédito de destruição e morte”, destacou. “A ciência e a realidade nos mostram que desta vez a conta chegou antes”. “Quantos líderes mundiais estão de fato comprometidos em salvar o planeta? Somente no ano passado, o mundo gastou mais de US$ 2 trilhões em armas. Quantia que poderia ser investida no combate à fome e no enfrentamento da mudança climática. Quantas toneladas de carbono são emitidas pelos mísseis que cruzam o céu e desabam sobre civis inocentes, sobretudo crianças e mulheres famintas?” Segundo o presidente, a conta das mudanças climáticas não é a mesma para todos e chegou primeiro para as populações mais pobres. Ele lembrou que o 1% mais rico do planeta emite o mesmo volume de carbono que 66% de toda a população mundial. “O mundo naturalizou disparidades inaceitáveis de renda, gênero e raça.” “Trabalhadores do campo, que têm suas lavouras de subsistência devastadas pela seca, e já não podem alimentar suas famílias. Moradores das periferias das grandes cidades, que perdem o pouco que têm quando a enchente arrasta tudo: casas, móveis, animais de estimação e seus próprios filhos. A injustiça que penaliza as gerações mais jovens é apenas uma das faces das desigualdades que nos afligem”. Para Lula, não é possível enfrentar as mudanças do clima sem combater as desigualdades. “Quem passa fome tem sua existência aprisionada na dor do presente. E torna-se incapaz de pensar no amanhã. Reduzir vulnerabilidades socioeconômicas significa construir resiliência frente a eventos extremos. Significa também ter condições de redirecionar esforços para a luta contra o aquecimento global.” “O não cumprimento dos compromissos assumidos corrói a credibilidade do regime. É preciso resgatar a crença no multilateralismo. É inexplicável que a ONU [Organização das Nações Unidas], apesar de seus esforços, se mostre incapaz de manter a paz, simplesmente porque alguns dos seus membros lucram com a guerra. É lamentável que acordos como o Protocolo de Kyoto ou os Acordos de Paris não sejam implementados”. “Governantes não podem se eximir de suas responsabilidades. Nenhum país resolverá seus problemas sozinho. Estamos todos obrigados a atuar juntos além de nossas fronteiras. O Brasil está disposto a liderar pelo exemplo”, concluiu, ao citar os ajustes das metas climáticas brasileiras, a redução do desmatamento na Amazônia e o que chamou de industrialização verde, agricultura de baixo carbono e bioeconomia. Fonte
Familiares são pilar de combate à tortura, dizem especialistas
Familiares de pessoas encarceradas são fundamentais para trazer à tona denúncias sobre o ambiente degradante nas unidades prisionais, além de violações de direitos humanos. No entanto, há tentativas de desacreditar, retaliar e até criminalizar as famílias, que são canais diretos entre o cárcere e os órgãos de denúncia. Suspensão de visitas e de castigos aos detentos são exemplos de ameaças relatados por eles. “Os familiares são o pilar da prevenção e combate à tortura”, disse a coordenadora do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT), a advogada Carolina Barreto Lemos. No estado de São Paulo, o número de denúncias de violações de direitos, como torturas, castigos, maus-tratos e ameaças, sofridos por pessoas encarceradas, triplicou em 2023, de janeiro a julho. Os relatos feitos à Defensoria Pública do estado (211 casos) são 3,45 vezes maiores do que as denúncias recebidas em todo o ano passado (61). Lemos ressalta que os familiares são ponto de apoio dos órgãos de combate à violação de direitos nos territórios, como presença constante e também como porta-vozes das denúncias às autoridades competentes. “Não se faz prevenção e combate à tortura sem os familiares, porque eles já fazem esse trabalho de certa maneira nas suas visitas ao sistema. A própria presença delas ali já funciona como vetor de prevenção e combate à tortura”, disse. Em diversas inspeções do Mecanismo realizadas no ano passado, familiares ajudaram a identificar as unidades penitenciárias mais importantes para vistoriar e participaram como especialistas convidados. “É uma prerrogativa que a gente tem de trazer as especialistas, porque entendemos que essas pessoas compreendem melhor que ninguém aquele espaço”, afirmou. O MNPCT faz parte do Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, instituído por lei federal em 2013. O órgão é composto por 11 peritos independentes, que podem acessar as instalações de privação de liberdade, como centros de detenção, hospital psiquiátrico, abrigo de pessoa idosa, instituição socioeducativa ou centro militar de detenção disciplinar. Em 2019, o governo do presidente Jair Bolsonaro transformou os cargos dos peritos do Mecanismo em não remunerados. Uma decisão judicial, três meses depois, determinou a reintegração dos profissionais ao cargo. “Este ano, a gente solicitou uma recomposição do orçamento do órgão e realmente veio muito mais robusto, o que nos permitiu fazer um número de eventos e de ações que a gente não conseguiu nos anos anteriores”, disse Lemos. Porta-vozes Familiar de um rapaz encarcerado no interior de São Paulo, Valéria* afirma que toda e qualquer denúncia feita por um preso só sairá da unidade se for por meio de um familiar e escondido. “Se depender de carta escrita por eles e destinada à Defensoria, jamais chegará ao seu destino pois os funcionários barram, então os familiares são esse elo essencial”. As denúncias que chegam à Defensoria Pública de São Paulo sobre o sistema carcerário têm origem majoritariamente nas visitas de defensores aos presídios e de familiares, e a partir disso o órgão começa um processo de investigação mais profunda, seja por uma inspeção ou por um pedido judicial de apuração. “A família nesse ponto é central, é quase impossível não ser familiar de preso nesse caso [de denúncia]”, disse o defensor público do Núcleo de Situação Carcerária, Diego Polachini. “A Defensoria, por meio do contato direto e de inspeção, recebe muita denúncia dos presos. Mas isso é muito pouco, porque a gente não consegue estar em todos os lugares nem em todos os presídios ao mesmo tempo. Ninguém realmente entra na cadeia [com frequência]. As únicas denúncias que podem vir são dos familiares que fazem visitas de fim de semana”, relatou o defensor, confirmando que cartas dos presos são censuradas pelos funcionários. “Cabe aos familiares trazer essas denúncias, muitas vezes ‘de boca’”. Segundo Polachini, o Ministério Público e o Poder Judiciário deveriam realizar a fiscalização no sistema prisional, mas raramente ocorre uma inspeção completa, em que entram no presídio e falam com os presos. “Muitas vezes, esses presos são escolhidos pela própria direção, então é uma observação muito enviesada”, disse. Para Valéria, a Defensoria Pública é tudo que as famílias e custodiados têm, mas existe uma defasagem imensa de defensores, que são sobrecarregados e sucessivamente não conseguem fazer todo o necessário para o combate à tortura e crueldades no sistema carcerário. “Seria muito importante os funcionários e diretores serem responsabilizados por seus atos, mas os próprios juízes não dão continuidade a denúncias de espancamentos, morte por falta de socorro, então eles sabem que nada acontecerá a eles criminalmente e assim, a cada dia, o sistema carcerário está mais agressor, opressor e tem mais e mais óbitos”, avaliou. Retaliações O Mecanismo e a Defensoria Pública de São Paulo já receberam diversos relatos de violações contra familiares e detentos que fizeram alguma denúncia. “O clássico é a pessoa denunciar, chegar na visita seguinte e a unidade falar que a visita foi cancelada, que não tirou a senha, inventam justificativas para a pessoa não conseguir entrar e fazer a visita. Isso é recorrente em vários estados do Brasil”, disse Carolina Lemos. Há ainda a deslegitimação de familiares em espaços públicos. “Por exemplo, se é uma pessoa que denuncia muito, ela vai sofrer o processo discriminatório dentro de órgãos, a recusa de que participe de reuniões. Até de pessoas expulsas de reuniões.” As tentativas generalizadas de perseguir os denunciantes e inibir possíveis denúncias também são registradas pela Defensoria de São Paulo. “Muitas vezes, os familiares que estão na fila para entrar no presídio têm que passar por procedimento muito longo, de revista, de scaner. Esse processo em si já é péssimo, mas esses familiares são constantemente ameaçados de ‘gancho’, que é a impossibilidade de visitação”, disse Polachini. Ele ressalta que as penas administrativas, como a suspensão de visitas, são dadas pelos diretores dos presídios e podem vir de fatos muito subjetivos, como desrespeito, desacato ou não cumprimento de ordem pelos familiares. Valéria reafirma que os familiares são constantemente desacreditados e sofrem retaliação. “Pois a denúncia feita à SAP [Secretaria de Administração Penitenciária] é encaminhada diretamente ao diretor, que normalmente ‘cava’ uma sindicância no custodiado ou dá ‘gancho’ no familiar quando vai visitar, alegando
Casos de sífilis e de HIV/aids aumentam entre homens jovens
Dados do Ministério da Saúde indicam que o país vem registrando queda nos casos de HIV/aids, mas não entre homens de 15 a 29 anos. Nesta faixa, o índice tem aumentado, chegando, em 2021, a 53,3% dos infectados de 25 a 29 anos. Os números da pasta também registram crescimento dos casos de sífilis em homens, mulheres e gestantes. No mês em que se realiza a campanha Dezembro Vermelho, iniciativa de conscientização para a importância da prevenção contra o vírus HIV/aids e outras Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs), a Sociedade Brasileira de Urologia (SBU) alerta que, se não tratadas, essas infecções podem causar lesões nos órgãos genitais, infertilidade, doenças neurológicas e cardiovasculares e até câncer como o de útero e de pênis. Ao longo do mês de dezembro, a sociedade médica esclarece as principais dúvidas envolvendo as ISTs por meio de live, posts e vídeos em seu perfil nas redes sociais (@portaldaurologia). Vacinação Apesar de o SUS oferecer a vacinação contra o HPV para meninos e meninas de 9 a 14 anos, segundo o Ministério da Saúde, a cobertura da segunda dose está em 27,7% entre os meninos. Já entre as meninas, a cobertura é maior, atingindo 54,3%, mas ainda longe dos 95% recomendados. Karin Jaeger Anzolch, diretora de Comunicação da SBU e uma das responsáveis pela campanha, disse que os urologistas têm percebido que o uso dos preservativos nas relações sexuais tem decaído muito nos últimos anos, enquanto a transmissão das ISTs segue em alta. “Outra grande preocupação é que muitas dessas infecções estão se tornando resistentes aos tratamentos existentes, em várias partes do mundo. Por essas razões, decidimos que temos que voltar a falar mais sobre o assunto, alertar e instruir a população e os agentes de saúde, e este é o terceiro ano consecutivo que adotamos o Dezembro Vermelho, mês já tradicional de conscientização sobre a aids, como o mês dedicado à temática de todas as ISTs”, disse a médica, em nota. Sintomas As ISTs podem ser causadas por vírus, bactérias ou outros microrganismos. Entre as mais comuns estão herpes genital, sífilis, HPV, HIV/aids, cancro mole, hepatites B e C, gonorreia, clamídia, doença inflamatória pélvica, linfogranuloma venéreo e tricomoníase. Algumas ISTs, em seu estágio inicial, são silenciosas, não apresentando sinais ou sintomas, ou os sintomas iniciais podem desaparecer espontaneamente, dando a falsa impressão de que a doença foi curada, o que pode atrasar o tratamento e agravar as complicações e as consequências, que podem ser infertilidade, câncer e até mesmo a morte. Entre os sintomas mais comuns estão: feridas, corrimento, verrugas, dor pélvica, ardência ao urinar, lesões de pele e aumento de ínguas. O uso do preservativo (masculino ou feminino) continua sendo a melhor forma de prevenção, além da vacinação contra ISTs como HPV e hepatite. Estatísticas de HIV/aids Dados do Boletim Epidemiológico de HIV/Aids 2022 do Ministério da Saúde apontam que o número de infectados vem caindo, exceto entre os homens de 15 a 29 anos. De acordo ainda com o boletim, a quantidade de infectados pelo HIV em 2021 era maior entre os homens de 25 a 29 anos (53,3%). Nas mulheres, o maior índice foi registrado entre 40 e 44 anos (18,4%). Somente em 2021, foram contabilizadas 28.967 infecções pelo vírus em pessoas com idade entre 15 e 39 anos, sendo 22.699 entre os homens e 6.268 entre as mulheres. Na análise do número de casos em geral, a maior quantidade nos últimos anos vem sendo registrada entre o sexo masculino. Segundo Karin Anzolch, na época que eclodiu a aids, e por vários anos depois, muitas pessoas se assustaram e de fato passaram a adotar e a exigir o uso do preservativo, bem como começaram a ter mais cuidado na escolha de parceiros. Entretanto, com o tempo, muitas pessoas se descuidaram e passaram a banalizar os riscos de contágio, o que não só as deixaram novamente expostas ao HIV, mas a todas as outras ISTs que são altamente prevalentes. Outro ponto importante de salientar, de acordo com a médica, é que, embora as pessoas que vivem com HIV hoje em dia disponham de tratamentos eficazes que não somente prolongam, mas também oferecem uma boa qualidade de vida, não se pode esquecer que, para isso, elas precisam tomar regular e constantemente medicações e ter uma rotina bem rígida de cuidados, exames e controles médicos, já que ainda se trata de uma doença incurável. “Agora imagine um jovem, iniciando a sua vida, contraindo uma doença dessas e já tendo que conviver com esse ônus, influenciando todo o seu presente e futuro. E é o que está ocorrendo, infelizmente, sobretudo entre o público jovem masculino, em que se verificou um aumento na incidência da doença. Isso é resultado de uma série de razões, mas sem dúvida a exposição durante a prática de sexo desprotegido, bem como o consumo de drogas injetáveis, estão entre os principais fatores”, afirmou a médica. Desde o início da epidemia de aids (1980) até 2021, foram notificados no Brasil 371.744 óbitos devido à doença. A maior proporção desses óbitos ocorreu no Sudeste (56,6%), seguido das regiões Sul (17,9%), Nordeste (14,5%), Norte (5,6%) e Centro-Oeste (5,4%). Estatísticas de sífilis Segundo o Boletim Epidemiológico Sífilis 2023, do Ministério da Saúde, de 2012 a 2022, foram notificados no país 1.237.027 casos de sífilis adquirida, 537.401 casos de sífilis em gestantes, 238.387 casos de sífilis congênita e 2.153 óbitos por sífilis congênita. Houve aumento na taxa de detecção de sífilis adquirida de 2012 a 2022, exceto em 2020, provavelmente em decorrência da pandemia de covid-19. O boletim também indica aumento em casos e taxa de detecção de gestantes com sífilis, de 2012 a 2022. A Região Sudeste é a campeã, com 248.741 casos registrados, seguida do Nordeste, com 112.073. “A sífilis se manifesta inicialmente como uma lesão na pele, no local onde foi feita a inoculação por contato direto com a lesão de uma pessoa infectada (sífilis primária). Mesmo sem tratamento, essa lesão inicial cicatriza espontaneamente, dando a falsa impressão de que a lesão não era ‘nada de grave’, mas a pessoa continua infectada e a
“Grande tristeza”, diz viúva de Merlino após decisão do STJ
A viúva do jornalista Luiz Eduardo Merlino, torturado e assassinado pela ditadura militar, criticou a decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que rejeitou a condenação do ex-coronel do Exército Carlos Alberto Brilhante Ustra. Para Ângela Mendes de Almeida, o entendimento é uma “grande tristeza” para a família.. Na quarta-feira (29), a Quarta Turma do STJ negou a tentativa dos familiares de Merlino de serem indenizados pelos atos de tortura praticados por Ustra por entender que o pedido prescreveu. O ex-coronel morreu em 2015, e a ação era movida contra seus familiares. Após o anúncio do resultado do julgamento, Ângela afirmou à Agência Brasil que a decisão mostra que o Judiciário brasileiro é conservador. “É uma grande tristeza para nós e para este país, que não revisa o seu passado”, afirmou. A viúva também disse que o tribunal descartou a imprescritibilidade de crimes contra a humanidade. “O argumento vencedor apresentado pela juíza Isabel Gallotti reconhece o fato como crimes horrendos e repugnantes, mas recorre a um artifício burocrático para definir que não é à pessoa, e sim ao Estado, a que se deve recorrer”, completou. O advogado Joelson Dias, representante da família Merlino, disse à Agência Brasil que vai ao Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar derrubar a decisão. Integrante do Partido Operário Comunista na época da ditadura militar, Merlino foi preso em 15 de julho de 1971, em Santos, e levado para a sede do DOI-Codi, então chefiado por Ustra, onde foi torturado por cerca de 24 horas e morto quatro dias depois. Julgamento O STJ analisou a legalidade da decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que derrubou a condenação dos herdeiros de Ustra a pagarem R$ 100 mil para a viúva e a irmã de Merlino, além de reconhecer a participação do então coronel nas sessões de tortura que mataram o jornalista. O julgamento começou em agosto deste ano, quando o relator, ministro Marco Buzzi, votou pela anulação da decisão do tribunal paulista e determinou que a primeira instância julgue o caso novamente. O relator entendeu que os crimes atribuídos a Ustra podem ser considerados contra a humanidade. Dessa forma, a pretensão de reparação às vítimas e seus familiares não prescreve. “A qualificação dos atos supostamente praticados pelo agente do DOI-Codi como ilícito contra a humanidade impede a utilização desse instituto, consideradas as gravíssimas violações cometidas contra direitos fundamentais e a proteção jurídica contra a tortura”, afirmou. O ministro acrescentou que a Lei de Anistia, aprovada em 1979 para perdoar crimes cometidos durante a ditadura, não impede o andamento das ações indenizatórias, que são de matéria cível. A divergência foi aberta com o voto da ministra Maria Isabel Galotti. Ela repudiou os atos de tortura, mas votou para manter a decisão da justiça paulista ao considerar o caso prescrito. Após sucessivos adiamentos, na quarta-feira (29) o julgamento foi retomado e, por 3 votos a 2, prevaleceu o voto divergente de Isabel Galotti contra o pedido de indenização. O posicionamento foi seguido pelos ministros João Otávio de Noronha e Raul Araújo. O ministro Antonio Carlos Ferreira acompanhou o relator e votou pela indenização. Fonte