Ajudante próximo do ex-presidente ordenou que bens não fossem cadastrados em lista de presentes. Na CPI, deputada afirmou que pedras não constam nos registros oficiais.
Em mensagem de e-mail, o ex-ajudante de ordens da Presidência Cleiton Henrique Holzschuk pediu para outros colegas ajudantes de ordens que pedras preciosas recebidas pelo então presidente Jair Bolsonaro fossem entregues em mãos para o tenente-coronel Mauro Cid. Ele também pediu para que os itens não fossem catalogados no acervo.
Segundo Holzschuk, a determinação partiu do próprio Cid, ajudante de ordens mais próximo de Bolsonaro.
As pedras foram presenteadas a Bolsonaro no dia 26 de outubro de 2022, durante comício de campanha pela reeleição em Teófilo Otoni (MG). Na data, o JN fez imagens do evento.
Os e-mails trocados pelos ajudantes de ordens estão em posse da CPI dos Atos Golpistas. O g1 teve acesso ao material.
Essa mensagem foi citada pela deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ) na sessão da CPI desta terça-feira (1º), que ouviu o ex-diretor-adjunto da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Saulo Cunha.
“Eu quero compartilhar com a CPMI algo muito grave – muito grave – que nós achamos em meio a mil e-mails que chegaram à esta CPMI”, disse a deputada ao se referir ao e-mail enviado por Holszchuck aos colegas.
Feghali afirmou ainda que as pedras não constam nos registros oficiais de presentes recebidos por Bolsonaro durante o governo.
“Essas pedras nunca foram registradas nem como presente ao Presidente da República e à Primeira-Dama, nem em lugar nenhum. Nós fomos olhar as 46 páginas dos 1.055 presentes recebidos pelo presidente e pela primeira-dama e não constam essas pedras preciosas”, concluiu a deputada.
Ordem de Mauro Cid
A mensagem sobre as joias aparece em uma conversa de e-mail em que, periodicamente, os ajudantes de ordens informam a equipe sobre assuntos do dia-a-dia do órgão, como contas para pagar e temas administrativos.
No dia 27 de outubro de 2022, surge uma nova mensagem no histórico do e-mail.
Holzschuk enviou um recado para outros dois ajudantes de ordens informando que um envelope contendo pedras preciosas e uma caixa de pedras preciosas foram enviados para o presidente e a primeira-dama, Michelle Bolsonaro.
De acordo com o texto de Holzschuk, o tenente-coronel Mauro Cid, ajudante mais próximo de Bolsonaro, ordenou que os bens não fossem cadastrados na lista de presentes recebidos por Bolsonaro.
Disse ainda que a orientação era para entregar as pedras em mãos para Cid.
O e-mail finaliza que, em caso de dúvida, os ajudantes poderiam procurar o sargento Marcos Vinícius Pereira Furriel.
“Foi guardado no cofre grande, 01 (um) envelope contendo predas preciosas para o PR [presidente] e 01 (uma) caixa de pedras preciosas para a PD [primeira-dama], recebidas em Teólifo Otoni em 26/10/22. A pedido do TC [tenente-coronel] Cid, as pedras não devem ser cadastradas e devem ser entregues em mão para ele [Cid]. Demais duvidas, Sgt Furriel está ciente do assunto”, escreveu Holzschuk.
Os ajudantes de ordem copiados na mensagem são Adriano Alves Teperino e Osmar Crivelatti.
O e-mail não relata quem presenteou Bolsonaro com as joias.
Outros oito emails foram trocados entre eles sobre o assunto. Duas mensagens fazem referência ao fato de que todos os presentes recebidos pelo presidente da República durante o mandato devem estar sob guarda do Gabinete Adjunto de Documentação Histórica (GADH).
Bolsonaro é investigado pela Polícia Federal pelos pacotes de joias da Arábia Saudita milionárias que entraram no país ilegalmente com uma comitiva do governo do então presidente. Mauro Cid também é investigado nesse caso. Cid foi preso em maio, em operação da PF que investiga fraude em cartão de vacinação para beneficiar Bolsonaro.
O que dizem as regras
Em 2016, o Tribunal de Contas da União (TCU) fixou entendimento a respeito do que deveria ser considerado acervo privado do presidente. O entendimento vale para presentes recebidos no mandato.
A Corte de Contas determinou que somente itens classificados como de “natureza personalíssima” ou de “consumo direto” deveriam ser excluídos do acervo público da União. Ou seja, somente esses itens poderiam ir para o acervo pessoal.
Oficialmente, as joias deveriam constar na lista do acervo museológico feito pelo Gabinete Adjunto de Documentação Histórica (GADH).
O acervo da Presidência registrou três itens recebidos pelo ex-presidente Bolsonaro durante a viagem a Teófilo Otoni, mas não fez menção às pedras preciosas: uma placa entregue a ele pelo Sindicato Rural do Teófilo Otoni, um quadro sem a identificação de quem presentou e um item de consumo, não especificado, entregue por uma indústria local de bebidas.
PCdoB vai pedir investigações
O PCdoB vai pedir que a Polícia federal, o Tribunal de Contas da União e o Supremo Tribunal Federal investiguem a origem e o paradeiro das pedras preciosas, porque Bolsonaro ocupava a Presidência do país no período da troca dos e-mails.
Feghali também solicitou à CPI dos Atos Golpistas a quebra dos sigilos bancário, fiscal e de mensagens da ex-primeira dama, Michele Bolsonaro. E também que ela seja convocada para depor.
Fonte: G1/Globo