A advogada Malu Borges Nunes sofreu constrangimento pelo presidente da 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Amazonas (TJ-AM), desembargador Elci Simões, durante sessão plenária realizada de forma online, na última segunda-feira (23).
Durante a fala de um dos participantes da sessão, é possível ouvir pequenos resmungos da filha da advogada no fundo, que está trabalhando em regime de home office (trabalhando em casa). Apesar do barulho não ter prejudicado a comunicação na videoconferência, o desembargador insistiu em dizer que a advogada estava ferindo a ética da profissão por deixar seu bebê participar da sessão.
“[…] pedir para doutora Malu que… aí quebra o silêncio das sessões do tribunal, interferências outras na sala em que a senhora está. Isso prejudica os colegas. Não deixe que outras interferências, barulhos, venham atrapalhar nossa sessão porque é uma sessão no tribunal. Não pode ter cachorro latindo, criança chorando. Se a senhora tiver uma criança, coloque no lugar adequado. São barulhos que tiram a nossa concentração. A senhora precisa ver a ética da advogada”, disse Simões.
A advogada, que estava amamentando a filha naquele momento, respondeu a repreensão com um “Ok, excelência, agradeço a compreensão”. Além disso, minutos antes do início do bloco, a advogada Malu Borges havia pedido preferência para que pudesse realizar a defesa dos processos, porém teve o pedido negado.
“Aí, a senhora tira a preferência dos demais. Os outros [advogados] vão acabar desistindo de fazer suas sustentações”, relatou o desembargador Wellington Araújo, que também estava na sessão.
Após o ocorrido, o caso teve grande repercussão nas redes sociais. Enquanto uns criticaram a atitude do desembargador, outros apoiaram, defendendo que sessões do gênero precisam de seriedade.
Em nota, Malu Borges pediu respeito e disse que, como outras mães no país, exerce jornada tripla, sem apoio. A Ordem dos Advogados do Brasil, seccional Amazonas também postou uma nota em suas redes sociais, repudiando o que tinha acontecido.
Confira a nota da advogada Malu Borges Nunes:
Nós mulheres só queremos que nossa voz seja ouvida, que nos respeitem no nosso ambiente de trabalho e na sociedade. Que nossa ética profissional não seja questionada por estarmos exercendo dupla/ tripla jornada sem qualquer tipo de apoio.
A minha realidade é a de milhões de brasileiras – trabalhadora e mãe. Obviamente que se eu tivesse uma opção melhor para deixar a minha filha (que acabou de completar 6 meses e depende de mim para tudo) enquanto eu trabalho eu aderiria, pois, a maior prejudicada sou eu, que trabalho os 3 turnos para dar conta da quantidade de tarefas.
Minha ética poderia ser questionada somente se eu deixasse de cumprir prazos e realizar atos, o que não é o caso. Não sou antiética por trabalhar em home office com a minha filha no colo. O triste episódio ocorrido no TJAM – não somente quanto a fala do Desembargador Elci, mas também quanto a falta de respeito a minha preferência legal (lactante) – infelizmente somente comprova, mais uma vez, o machismo estrutural da nossa sociedade.
Isso porque, ao passo que eu fui condenada por estar com uma bebê resmungando (não chorando) na sessão, há uma semana um pai advogado teve preferência no seu processo no STJ por estar com o seu filho de 1 ano presente (matéria de repercussão nacional, inclusive). Mesmo diante da falta de compreensão com minha situação, continuarei sustentando amamentando ou com a minha filha próxima, que é o local adequado para ela.