Projeto Portinari leva exposição itinerante a comunidades fluminenses


O Palacete Princesa Isabel, localizado em Santa Cruz, zona oeste do Rio de Janeiro, recebe a partir de hoje (2) a exposição itinerante Portinari Arte e Meio Ambiente, que vai percorrer, até o final de outubro, comunidades, favelas, bairros da capital do estado e, inclusive, um município da Baixada Fluminense. Santa Cruz foi escolhido para abrir a mostra porque foi reconhecido recentemente como Bairro Imperial, por ter abrigado a casa de veraneio da Coroa portuguesa.

A exposição reúne 22 réplicas de obras do pintor, com temas relacionados ao meio ambiente e à natureza brasileira, que são apresentadas a crianças, jovens e adultos de todas as idades.

Por aproximar o pintor Portinari das comunidades, a exposição ficou conhecida como Portinari das Quebradas. “Pela primeira vez, Portinari vai para as quebradas”, comentou, em entrevista à Agência Brasil, o coordenador-geral do Núcleo de Arte e Educação do Projeto Portinari, Guilherme de Almeida. Segundo ele, a ideia foi tirar Portinari dos grandes centros onde, mesmo com entrada gratuita, a obra do artista não é tão acessível à totalidade do público, seja pela dificuldade de acesso, pelo custo do transporte ou pela distância do local onde as pessoas vivem.

A opção foi levar Portinari ao encontro das pessoas, nas próprias comunidades. “Essa é uma forma de socializar o trabalho de Portinari, vida e obra. E através da nossa relação com os monitores e arte-educadores, em cada uma das exposições, a gente dá um novo significado para esse trabalho. Sempre buscando a descoberta da identidade brasileira, a identidade de cada pessoa que é confrontada com o trabalho de Portinari. É impossível você se deparar com a riqueza do trabalho que ele apresenta e permanecer inerte”, destacou Almeida.

Além da exposição itinerante, o projeto abrange também oficinas de arte oferecidas gratuitamente aos visitantes das diversas localidades.

Provocação

A exposição vale também como uma provocação para o despertar das pessoas para a importância da arte e da cultura. O coordenador-geral recordou que Candido Portinari nasceu e foi criado no interior de São Paulo. Era filho de família humilde descendente de imigrantes italianos, mas seu pai notou o potencial do filho para arte quando começou a pintar, aos 9 anos de idade. Aos 11 anos, ao perceber que o filho tinha talento, decidiu que ele devia ir para o Rio de Janeiro estudar e ter uma técnica mais apurada.

Almeida lamentou que a cultura ainda seja vista por muitos como algo supérfluo, especialmente em localidades onde existem necessidades mais iminentes. Nesse sentido, destacou a comparação feita pelo ex-ministro da Cultura Gilberto Gil de que cultura e arte são como arroz com feijão e imperam no nosso dia a dia.

A meta, segundo ele, é olhar para a necessidade humana como algo multilateral, envolvendo as relações interpessoais, o desenvolvimento intelectual, profissional e, também, o desenvolvimento cultural e artístico ético. “A gente precisa alimentar a alma, o intelecto, para que possa continuar se desenvolvendo. Essa é a grande proposta”, afirmou Almeida.

Eixos

PORTINARI NAS QUEBRADAS

PORTINARI NAS QUEBRADAS – Divulgação/PORTINARI NAS QUEBRADAS

O Projeto Portinari baseia as exposições pelos cinco eixos da Organização das Nações Unidas (ONU) iniciados pela letra “p”: planeta, pessoas, paz, prosperidade e parcerias.

Nessa exposição itinerante, a opção foi por planeta, inspirada pela temática da sustentabilidade, levada ao mundo através do evento Rio+20, realizado no Rio de Janeiro, há 10 anos. Por isso, a exposição tem como fios condutores a pintura de Candido Portinari e o meio ambiente, que são temas que permitem desenvolver conteúdos relativos às áreas de conhecimento trabalhadas nas escolas, com crianças e adolescentes.

“A Rio+20 foi um marco não só para o Rio de Janeiro e o Brasil, mas para a comunidade internacional como um todo”.

A mostra trata dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU relativos à valorização de água potável e saneamento, energia limpa e acessível, ao consumo e produção sustentáveis, à ação contra a mudança global do clima, vida na água e vida terrestre.

“A gente entendeu que era uma forma de trabalhar a questão educativa e educacional também, envolvendo educação e direitos humanos. Achamos que era uma forma coerente de abordar isso, tanto nacional como internacionalmente”, pontuou Guilherme de Almeida.

Democratização

Embora a exposição itinerante tenha uma mesma temática, em cada região onde será apresentada, ela adquire um caráter diferente. Isso decorre do fato de, em cada local, a mostra ter sido construída coletivamente com a comunidade local. São ao todo seis comunidades do estado do Rio de Janeiro distintas entre si, com aspectos culturais diversos.

Guilherme de Almeida ressaltou a participação popular em cada uma delas, com as pessoas escolhendo as abordagens, temáticas e oficinais que atendiam à demanda de cada localidade. “Nós tivemos a preocupação de não levar o trabalho pronto, mas dialogar com as comunidades.”

Foram contratados 36 arte-educadores naturais de cada comunidade e o Projeto Portinari garantiu sua formação extracurricular, com certificação. “São pessoas que as comunidades apontaram e que trabalham com educação. O Projeto valorizou esses saberes”, afirmou Almeida.

As 22 réplicas expostas se parecem “ao máximo possível” com as obras originais de Candido Portinari. Apenas as medidas são diferentes. De forma experimental, os responsáveis pelo projeto mandaram fazer duas telas táteis para que as pessoas com deficiência visual também possam ter uma percepção da obra de Portinari por si mesmas, ao passarem as mãos sobre as obras, sem dependerem exclusivamente de descrições em Braille. A inclusão é uma das preocupações do Projeto Portinari, destacou Guilherme de Almeida, que é uma pessoa com transtorno do espectro autista (TEA) e pesquisador na área de educação inclusiva. “É uma preocupação que essas exposições sejam inclusivas e, verdadeiramente, para todas as pessoas.”

A exposição itinerante ficará no Palacete Princesa Isabel, em Santa Cruz, até o dia 13 de agosto. Em seguida, irá para a Biblioteca Parque da Rocinha (de 14 a 27/8), Museu do Grafite, na Pavuna (de 18/08 a 10/09), Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES), em Laranjeiras, onde serão realizadas experiências sensoriais com as obras (de 11/09 a 24/09), Ekballo, em Madureira (de 25/09 a 8/10) e, fechando o ciclo, no Gomeia Galpão Criativo, em Duque de Caxias (de 9 a 22/10), na Baixada Fluminense.

A mostra é aberta a pessoas de todas as faixas etárias e níveis de escolaridade e engloba atividades de arte, com oficinas de pintura a guache, desenho, recorte e colagem, mosaico, arte com sucata, contação de histórias e teatro.

Segundo o filho de Portinari, João Candido Portinari, a missão do Núcleo de Arte-Educação e Inclusão Social do Projeto Portinari é levar a mensagem do artista às crianças, aos jovens e ao público em geral, por meio de suas obras e também de seu pensamento, expresso nos textos e poemas que o pintor nos legou.

“É nítida a identificação imediata de crianças, jovens e adultos, que se reconhecem nas representações feitas pelo artista e veem suas próprias narrativas presentes nas obras. Estes laços de pertencimento ajudam a desmistificar a arte e instigar o desejo de fazer a sua própria representação. A aproximação de crianças, jovens e adultos à arte, potencializa a ampliação de mundos, de estéticas, de pontos de vistas, de modos de perceber a realidade e de interagir com o mundo”, completou João Candido Portinari, diretor e fundador do Projeto Portinari.

Projeto Portinari

O Projeto Portinari foi fundado dentro da área científica da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e tem como objetivo, além do resgate da vida e da obra de Candido Portinari, gravar a obra do artista na busca da identidade cultural e consolidação da memória nacional.

Através de intenso trabalho de pesquisa, organização e digitalização de imagens, o projeto já catalogou mais de 5.300 pinturas, desenhos e gravuras; mais de 25 mil documentos sobre a obra e vida de Portinari; mais de 6 mil cartas, além de fotografias, filmes, recortes; mais de 10 mil publicações; mais de 70 depoimentos de artistas, intelectuais e personalidades do tempo de Portinari, totalizando 130 horas gravadas. Realizou ainda pesquisa de autenticidade das obras (Projeto Pincelada), além da publicação do Catálogo Raisonné “Candido Portinari – Obra Completa”, primeira publicação dessa natureza na América Latina.

O Núcleo de Arte e Educação e Inclusão Social do Projeto Portinari foi criado em 1997. Seu objetivo é desenvolver programas de cunho cultural que possam ser levados através de exposições de réplicas digitais a locais em que haja uma carência de atividades voltadas para cultura e educação, visando ampliar o atendimento a municípios com escassos recursos para investimentos em arte e cultura.



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