Operação do MP e da Civil investiga contratos de assistência social de fundação estadual e da Prefeitura do Rio entre 2013 e 2018, nas gestões Cabral e Pezão, no estado, e Paes e Crivella, no município. Pedro se diz ‘indignado’; Cristiane aponta ‘perseguição’.
O secretário estadual de Educação do Rio de Janeiro, Pedro Fernandes, foi preso nesta sexta-feira (11) na segunda fase da Operação Catarata, que investiga supostos desvios em contratos de assistência social no governo do estado e na Prefeitura do Rio.
Procurada pela operação, a ex-deputada federal Cristiane Brasil não foi encontrada.
O Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) e a Polícia Civil afirmam que o esquema pode ter desviado R$ 30 milhões dos cofres públicos entre 2013 e 2018 — parte em espécie.
Pedro foi preso, segundo o MPRJ, por ações durante sua gestão na Secretaria Estadual de Tecnologia e Desenvolvimento Social nos governos de Sérgio Cabral e de Luiz Fernando Pezão — antes de assumir a Educação do RJ a convite de Wilson Witzel.
A Fundação Estadual Leão XIII, alvo da investigação, era vinculada à secretaria de Pedro.
Ao receber voz de prisão, Pedro Fernandes apresentou um exame positivo de Covid-19, o que transformou a prisão preventiva em domiciliar.
Ex-deputada e ex-secretária procurada
Havia um mandado de prisão também para a ex-deputada federal Cristiane Brasil, filha do também ex-deputado federal Roberto Jefferson (que não é alvo da operação).
Cristiane responde por atos supostamente praticados entre maio de 2013 e maio de 2017, quando assumiu secretarias municipais nas gestões de Eduardo Paes e Marcelo Crivella.
Cristiane não foi encontrada em casa, mas, segundo sua assessoria, ela não está no RJ e vai se apresentar à policia ainda nesta sexta.
Cristiane foi secretária de Envelhecimento Saudável da Prefeitura do Rio e chegou a ser nomeada ministra do Trabalho no governo Temer, mas teve a posse suspensa pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por conta de condenações na Justiça Trabalhista.
Presos na operação
- Pedro Fernandes, secretário estadual e ex-presidente da Fundação Leão XIII;
- Flavio Salomão Chadud, empresário;
- Mario Jamil Chadud, ex-delegado e pai de Flavio;
- João Marcos Borges Mattos, ex-diretor de administração financeira da Fundação Leão XIII.
Eles vão responder por organização criminosa, crimes licitatórios, peculato, corrupção ativa e passiva e lavagem de dinheiro.
O que dizem os investigados
A defesa de Pedro Fernandes disse que o secretário “ficou indignado com a ordem de prisão”.
“O advogado dele vinha pedindo acesso ao processo desde o final de julho, mas não conseguiu. A defesa colocou Pedro à disposição das autoridades para esclarecimentos na oportunidade. No entanto, Pedro nunca foi ouvido e só soube pela imprensa de que estava sendo investigado por algo que ainda não tem certeza do que é”, diz a nota.
“Pedro confia que tudo será esclarecido o mais rápido possível ,e a inocência dele, provada”, emendou.
Em nota, Cristiane Brasil afirmou que a denúncia é “uma tentativa clara de perseguição política”.
“Tiveram oito anos para investigar essa denúncia sem fundamento, feita em 2012 contra mim, e não fizeram pois não quiseram”, disse. “Mas aparecem agora que sou pré-candidata a prefeita numa tentativa clara de me perseguir politicamente, a mim e ao meu pai.”
“Em menos de uma semana, Eduardo Paes, Crivella e eu viramos alvos. Basta um pingo de racionalidade para se ver que a busca contra mim é desproporcional. Vingança e política não são papel do Ministério Público nem da Polícia Civil”, emendou.
Fraude em duas esferas
Na primeira etapa, em julho de 2019, a força-tarefa prendeu sete pessoas suspeitas de fraudar licitações da Fundação Estadual Leão XIII, sob gestão da secretaria de Fernandes.
Com o aprofundamento das investigações na Leão XIII, a força-tarefa afirma que o esquema incluiu órgãos da Prefeitura do Rio, chefiados por Cristiane Brasil — a Secretaria Municipal de Envelhecimento Saudável e Qualidade de Vida e a Secretaria Municipal de Proteção à Pessoa com Deficiência.
Os contratos sob investigação, firmados entre 2013 e 2018, custaram quase R$ 120 milhões aos cofres públicos. O MPRJ afirma que sobre os serviços contratados eram cobradas vantagens indevidas que variaram de 5% a 25% do valor acertado.
O total desviado chegaria, segundo a denúncia, a R$ 30 milhões.
Justiça aceita denúncia
Além de expedir cinco mandados de prisão e seis de busca e apreensão, a 26ª Vara Criminal da Capital aceitou a denúncia do MPRJ e tornou 25 pessoas rés:
- Álvaro Basílio Neiva, responsável pela Central de Oportunidades
- Andre Brandão Ferreira, pregoeiro titular da Leão XIII
- Brunno Nogueira Melchiades de Souza, responsável pelo Cebrac (Centro de Reabilitação e Integração Social)
- Bruno Campos Selem, responsável pela Tercebrás
- Cristiane Brasil Francisco, ex-secretária municipal de Envelhecimento Saudável e Qualidade de Vida
- Erika Yukiko Muraoka de Souza, ex-presidente da Leão XIII
- Erinaldo Augusto Rocha, empregado da Servlog-Rio
- Flávio Salomão Chadud, responsável pela Servlog-Rio
- Isabel Cristina Teixeira Alves, ex-coordenadora jurídica da Fundação Leão XIII
- Isabela Sá Madruga
- João Marcos Borges Mattos, o Gordinho ou Johnny, ex-diretor financeiro da Leão XIII
- Jorge Antonio Oliveira Costa, responsável pelo Ibrapes (Instituto Brasileiro de Ações, Pesquisas e Estudos Sociais)
- Jorge Magno Menezes Pinto, motorista de Flavio Chadud
- Kelly Regina da Silva Oliveira Vieira
- Marcelle Braga Chadud, responsável pelo Grupo Galeno Distribuidora de Material Médico-Hospitalar
- Marcus Vinicius Azevedo da Silva, o MV, sócio administrador da Rio Mix 10
- Mario Jamil Chadud, delegado aposentado da Polícia Civil
- Pedro Henrique Fernandes da Silva, secretário estadual de Educação
- Raphael da Silva Gonçalves, responsável pela Só Lazer
- Renato Luiz Patuzzo, sócio administrador do Instituto de Oftalmologia do Rio de Janeiro
- Rodrigo Motta de Oliveira
- Sergio Bernardino Duarte, o Sérgio Fernandes, ex-presidente da Fundação Leão XIII
- Suely Soares da Silva, assessora de Cristiane Brasil;
- Vera Lucia Gorgulho Chaves de Azevedo, assessora de Cristiane Brasil
- Vitor Alves da Silva Júnior, sócio administrador da Rio Mix 10
A primeira fase da Catarata mirou o projeto social assistencial Novo Olhar, que oferecia consultas oftalmológicas e distribuição de óculos para população de baixa renda.
A Controladoria-Geral do Estado (CGE) detectou a ocorrência de fraudes em quatro pregões eletrônicos entre 2015 e 2018, na Fundação Estadual Leão XIII. O MPRJ afirma que as concorrências foram vencidas fraudulentamente pela Servlog-Rio.
O MPRJ e a Polícia Civil sustentam ter constatado fraudes em diversos outros projetos sociais não só na Leão XIII, mas também na Secretaria Municipal de Envelhecimento Saudável e Qualidade de Vida do Rio e na Secretaria Municipal de Proteção à Pessoa com Deficiência do Rio.
Outros programas afetados, segundo a denúncia, foram o Qualimóvel, o Rio Cidadão e o Agente Social.
Quem é Pedro Fernandes
Pedro Fernandes tem 37 anos e ocupa o cargo de secretário Estadual de Educação do Rio de Janeiro desde janeiro de 2019.
Ele foi candidato ao Governo do Estado nas ultimas eleições, mas foi derrotado no primeiro turno e apoiou o governador afastado Wilson Witzel no segundo.
Pedro é de uma família tradicional na política no estado. Ele é filho da vereadora Rosa Fernandes, que está no sétimo mandato na Câmara Municipal do Rio. Ele é neto de Pedro Fernandes Filho, que foi deputado estadual.
Antes de ser secretário, Pedro foi o deputado estadual mais jovem a ser eleito na Alerj, com apenas 23 anos, em 2007, pelo extinto PFL. Em 2008, Pedro foi candidato a vice-prefeito da capital na chapa de Solange Amaral.
O político foi secretário estadual de Assistência Social e Direitos Humanos, durante o governo Cabral, e secretário de Assistência Social do município do Rio de Janeiro, em 2017, aceitando o convite do prefeito Marcelo Crivella.
Quem é Cristiane Brasil
Cristiane Brasil tem 46 anos e é advogada. Ela foi vereadora da cidade do Rio de Janeiro e deputada federal. Ela é filha do político Roberto Jefferson, ex-deputado federal cassado.
Ela ocupou o cargo de secretária Extraordinária da Terceira Idade e secretária Especial de Envelhecimento Saudável e Qualidade de Vida na Prefeitura do Rio.
Em janeiro de 2018, ela foi nomeada pelo presidente Michel Temer para o cargo de ministra do Trabalho, mas teve a posse suspensa pela então presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia.
O pedido de suspensão foi acatado sob o argumento de que ela não atendia ao requisito da moralidade administrativa pois já havia sido condenada por dívidas trabalhistas. Cristiane chegou a questionar a decisão do tribunal.
No fim de janeiro de 2018, em um vídeo circulou em redes sociais, Cristiane se defendeu das acusações nos processos nos quais é ré na Justiça do Trabalho em um barco. Em nota, ela afirmou ter sido alvo de “machismo”, sem direito a defesa.
No fim de fevereiro de 2018, o PTB desistiu da indicação dela ao cargo.